Manchester À Beira-Mar (Manchester by the Sea, 2016) | Crítica

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Matheus R. B. Hentschke

Ao ler uma sinopse como essa: Lee Chandler (Casey Affleck) é obrigado a cuidar de seu sobrinho Patrick (Lucas Hedges) após a morte prematura do pai do rapaz, seu irmão, Joe Chandler (Kyle Chandler), a sensação que fica é a de se assistir algo nada motivador, certo? Parece uma daquelas obras catárticas, que trazem uma jornada de redenção e autoconhecimento, com ligações emocionais de boutique junto ao público. Ainda mais, quando essa mesma obra é indicada em várias categorias do Oscar, o feeling de ser um sucessor espiritual de filmes como A Teoria de Tudo (Theory of Everything, 2014) de James Marsh e O Discurso do Rei (The King's Speech, 2010) de Tom Hopper fica mais saliente. Ledo engano.

Manchester À Beira-Mar não poderia ser mais singular em sua maneira de relatar a vida de pessoas que foram quebradas por algum obstáculo em suas jornadas. E que obstáculos. Aqui não há espaço para aqueles estudos de personagem artificiais e banais como no superestimado Blue Jasmine (Woody Allen, 2013). Toda a obra se constrói de maneira a mostrar a vida sem floreios. A fotografia sóbria, que valoriza tons de azul e cinza, contribui para um desenrolar de enredo que preza pela verossimilhança máxima, tendo o desenvolvimento de cada um de seus personagens engrandecidos pelo trivial: uma conversa no carro entre Lee e Patrick, uma ida ao bar para encher a cara e uma interação entre Lee e os funcionários do hospital, concedem ao longa um aspecto paradoxal, no qual cenas que têm uma construção seca, ainda assim possuem uma carga emocional no tom preciso, sabendo elevar-se e equilibrar-se com maestria. 

De fato Kenneth Lonergan, diretor e roteirista da película, sabe trabalhar com seu material, sem nunca se apressar, sem nunca deixar o ritmo cair. A não linearidade do enredo, que mostra como Lee Chandler chegou àquele estado gradativo de autopenitência com flashbacks sutis, conseguem dar vigor e trazer a manutenção do interesse por parte do espectador em relação ao presente frio vivido pelo protagonista. Por falar em protagonista, que atuação impecável de Casey Affleck, que pouco a pouco vinha se estabelecendo na indústria desde seu destaque em Medo da Verdade (Gone Baby Gone, 2007) de seu irmão Ben Affleck e de O assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford (Andrew Dominik, 2007). Finalmente, ele se consolida e entrega uma atuação que será provavelmente coroada com o Oscar de Melhor Ator. Mesmo sem ter visto todos seus concorrentes e caso haja outro candidato tão ou mais merecedor do que ele, não será de maneira alguma injusta sua vitória, em um trabalho que mostra toda a queda de um homem que não deseja mais recuperar-se. 





Por sinal, Manchester À Beira-Mar traz um verdadeiro espetáculo de atuações. Michelle Williams, no papel da ex-mulher de Lee, Randi, consegue erguer uma personagem com múltiplas camadas, mesmo com seu limitado tempo em cena, que sabe transitar tanto em momentos de leveza, quanto sequências de maior carga dramática, com uma fluidez impressionante. Fosse um ano menos disputado, Williams levaria a estatueta na categoria de Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante certamente. Não só Williams e Affleck destacam-se, mas também Lucas Hedges consegue trazer uma atuação de valor com uma justa indicação pela academia. No entanto, uma vitória já soa como um superlativo.

Mas, por falar em indicações ao Oscar, Kenneth Lonergan é verdadeiramente merecedor de cada uma delas tanto pelo seu roteiro competente quanto pela sua direção afiada. É impecável sua visão de cinema, com um tom severo de realidade aliviado por pitadas de um humor sutil. Realmente, o diretor conseguiu levar uma obra de delicada execução com refino e configura-se como um dos grandes filmes dessa temporada - confira os vencedores do Oscar 2017.

Nota: 9,0 / 10



Trailer:


Entrevista com Elenco:

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