Lion - Uma Jornada para Casa (Lion, 2016) | Crítica

20:38:00



Matheus R. B. Hentschke

Ao final de Lion - Uma Jornada para Casa (fique tranquilo que não terá spoilers) é mostrada uma cena real em que os personagens verídicos daquela história ali narrada estão passando por um momento de emoções genuínas. Naquele instante, ficou claro que o filme que adaptou a história daquelas pessoas não conseguiu trazer a atmosfera e os conceitos verídicos com um mínimo de precisão emocional e acabou por limar todas as possibilidades de marcar o espectador ao entregar uma obra de situações pasteurizadas com o nítido intuito de ser rotulado como um "agrada a todos os gostos". 


O tiro saiu pela culatra. Na verdade, não é bem assim, visto que ainda, por incrível que pareça, a Academia continua sendo ludibriada com tais artifícios, tendo indicado Lion em diversas categorias assim como foi com O Jogo da Imitação (The Imitation Game, 2014) de Morten Tyldum e com O Discurso do Rei (King's Speech, 2010) de Tom Hopper. Ambos tinham um conteúdo extremamente relevante a ser contado, mas que acabou sendo duramente prejudicado ou por um roteiro pífio ou por uma direção quase documental.

Em Lion - Uma Jornada para Casa, o que o torna um misto de emoções enlatadas é a adaptação pífia do livro que concede nome ao título do filme feita por Luke Davies, absurdamente indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Adaptado. O enredo que traz a história de Saroo (Sunny Pawar), um menino pobre indiano, que ao se perder de seu irmão, em uma estação de trem, acaba por ter de sobreviver nas ruas enfrentando todo o tipo de desamparo e violência, apresenta, inicialmente, uma força narrativa ao aliar o tom de aventura realista com o pano de fundo político-social de um país em que as desigualdades sociais e a miséria são constantes na realidade da população. 



Contudo, com a progressão da história para o período em que Saroo já se encontra mais velho e morando com a sua família adotiva na Austrália, tudo soa desconjuntado, parecendo que Luke Davies pulou algumas passagens do livro para contar a história de uma vez e entregar ao público um trabalho superficial, que até parece belo, mas definitivamente, se há algum mérito, não é por causa de seu roteiro.

Os responsáveis por agregar alguma qualidade a película é devido tanto aos intérpretes quanto a direção acertada de Garth Davis. Mesmo sendo seu primeiro filme, Davis consegue impor sua assinatura ao fazer panorâmicas das mais diversas paisagens tanto na Índia quanto na Austrália trazendo grandiloquência ao seu trabalho, com o auxílio da fotografia justamente indicada ao Oscar de Greig Fraser, que já havia mostrado seu talento em Rogue One: Uma História Star Wars. Além disso, há acertos na câmera sempre em movimento nos momentos de maior tensão, principalmente, quando o espectador acompanha a luta de Saroo ainda criança tentando sobreviver às desventuras a ele impostas. 


Por falar no protagonista, que encantador é ver o pequeno Sunny Pawar interpretar Saroo, que a todo instante tem sua inocência e infância sendo postas à prova em um mundo que lhe concede poucas ou nenhuma oportunidade. De fato, esse menino tem potencial para aparecer em outros projetos no futuro e se destacar. Aliás, o destaque também vai para a atuação de Dev Patel, que interpreta o Saroo mais velho e escancara a busca por identidade de um jovem que por muito tempo tentou ir além de suas origens humildes, mas que precisava retornar para reencontrar-se com um passado que ainda lhe cobrava respostas. Uma merecida indicação ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante, apesar do filme não acompanhar seu ritmo como um todo.

Outra atuação que vale menção é a de Rooney Mara, que faz todo o possível com o pouco de tempo e de desenvolvimento que o roteiro adaptado lhe concede. Mara consegue trazer expressões e nuances interessantes para uma personagem que poderia ser descartável, como foi o caso da mãe adotiva interpretada por Nicole Kidman, que mesmo tendo um monólogo em uma cena com Patel, não consegue desenvolver sua personagem a contento, tornando sua indicação ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante um mistério a ser revelado.



Em suma, o que mais incomoda em Lion é a exigência do roteiro em sempre querer avançar na história de vida de Saroo, parando apenas para mostrar flashbacks e recordações redundantes embalados por uma trilha sonora que aos poucos começa a saturar, sem desenvolver minimamente cada personagem. Tal fato acaba promovendo uma série de momentos de vazios a vergonhosos, respectivamente, como na cena em que o Saroo de Dev Patel conversa com a sua mãe sobre a crise familiar instaurada ao longo de anos e como na interminável e desnecessária sequência que levam a um plot twist com um marketing excessivo do Google Earth. O gosto que fica é que a obra poderia ter sido algo bem maior fosse o conteúdo em que é baseado melhor compreendido pelo seu roteirista.

Nota: 6,5 / 10


Observação: No site do filme, há informações sobre como o filme ajudou no auxílio de crianças de rua na Índia e por todo o mundo. Além disso, há a possibilidade de cada um ajudar nessa questão tão importante. Para saber mais, copie o link que direciona para o site de Lion:

http://lionmovie.com/

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