Jackie (2016) | Crítica

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Matheus R. B. Hentschke

É impossível desvincular Jackie de suas indicações ao Oscar. Com isso em mente, durante a espera para entrar na sala de cinema uma breve imagem veio à tona, ou melhor, um desejo aos senhores da sétima arte se materializou: que esse não fosse mais um daqueles filmes biográficos indicados ao Oscar sem estofo, com um roteiro engessado, guiado por uma direção quase documental e que se sustenta apenas em sua protagonista. Sim, acertou quem pensou que meu temor fosse assistir um A Dama de Ferro (Phyllida Lloyd, 2011), em que o único aspecto de qualidade está na atuação sempre brilhante de Meryl Streep.


Nos primeiros momentos de Jackie já é possível enxergar seu diferencial. Além de também ter uma atriz formidável - como Natalie Portman - atuando em alto nível, a obra entrega muito mais. A começar pela fotografia bastante acinzentada de Stéphane Fontaine, que trabalhou em Elle (Paul Verhoven, 2016) e Capitão Fantástico (Matt Ross, 2016), concedendo um ar de pesar e luto para o estudo de personagem produzido na película. 

Além disso, o recorte feito pelo roteirista Noah Oppenheim para contar a história de Jackie Kennedy em uma narrativa não-linear ajuda a impulsionar o que poderia ter sido um filme enfadonho. Acompanhar Jackie em seus momentos pós-morte de seu marido, seja planejando o funeral dele ao lado de seu irmão Bobby Kennedy (Peter Sarsgaard) seja concedendo uma entrevista para o repórter interpretado por Billy Crudup, trazem condições favoráveis para o verdadeiro destaque de Jackie: Natalie Portman.



Mesmo com todas qualidades técnicas que a obra apresenta, como a marcante e justamente indicada ao Oscar trilha sonora composta por Mica Levi e o belo figurino assinado por Madeline Fontaine, Jackie tem sua força como arte em sua protagonista. Natalie Portman além de sua fisionomia dar os ares da ex-primeira dama, ela consegue imprimir uma personificação magistral, com a atriz realmente adquirindo o jeito de falar e os trejeitos da personagem objeto de estudo. Entretanto, realizar tal feito seria uma mera boa imitação, não fosse as camadas e as nuances que Portman concede a uma mulher quebrada com os excessos de perdas sofridas, mas que ainda assim preservava a habilidade política e a força pessoal para gerir sua família e para sustentar os últimos momentos do que foi o mais próximo de uma monarquia nos Estados Unidos da América: a presidência Kennedy.

O diretor Pablo Larraín consegue, com sua câmera sempre valorizando sua musa com ângulos fechados em primeiríssimo plano, não só captar os detalhes da performance de Portman, como também conceder sequências e planos interessantes que levam o espectador a sentir a intensidade daqueles momentos históricos mostrados. Cenas, como a descida do avião presidencial, em que Jackie e John Kennedy (Caspar Phillipson), logo antes do derradeiro evento que alterou suas vidas, cumprimentam a todos e a primeira dama sustenta seu semblante de poder, ainda que estivesse ocultando a ansiedade natural de um ser humano que vive momentos singulares, ilustram a singeleza das situações construídas em Jackie. Não só isso, mas além de cenas marcantes, Larraín consegue trazer atores coadjuvantes, como Peter Sarsgaard e Greta Gerwig saírem de seus papéis costumeiros e auxiliarem na elevação de sua complexa protagonista.




De fato, Jackie consegue montar um estudo de personagem soberbo, mas que não se deixa ficar só nesse ponto como destaque, trazendo direção, figurino e trilha sonora como formas de engrandecer sua protagonista que - magistralmente interpretada por Natalie Portman - faz o cinéfilo mais atento a temporada de premiações pensar: será mesmo que Portman não deveria ganhar seu segundo Oscar por esse trabalho? Infelizmente, Jackie merecia mais destaque da Academia que considera obras como Lion - Uma Jornada Para Casa (Garth Davis, 2016) e A Chegada (Denis Villeneuve, 2016) melhor executadas do que esse belo drama biográfico. 

Nota: 8,5 / 10

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